19.3.06

Ao revelar as fotos que tirara, levou um susto. Um monstro? Um desastre da genética? Um alienígena? Comunista? Um monte de lixo? Ao notar que se tratava de um homem em pleno processo de derretimento, ficou chocado! Mas seu lado mercenário foi mais forte que o humano e logo pôs-se atrás da aberração para, ao menos, tirar mais uma foto e algumas vantagens da criatura. “A essa altura ele já deve ser um quarto de homem”, pensou. Correu atrás de pistas que pudessem levá-lo a ele e pôde perceber que “aquilo” já deixara seu rastro de pânico, terror e vísceras. Soube por diversos depoimentos que a massa disforme relatava o acontecido a qualquer um que passasse, e discorria sobre a sua “sorte”. Era um astronauta que havia retornado de uma viagem experimental a Saturno e seus anéis. A partir do momento em que foi posto em quarentena na NASA, começou a derreter. Fácil imaginar como ele escapou de lá. Ele só ameaçou cuspir em quem tentasse impedi-lo de sair. O astronauta, instintivamente, rastejou por caminhos alheios à sua memória. Claro, seu cérebro já não era o mesmo! Talvez esse fato unido a uma perturbação psicológica decorrente da desintegração – lembrou-se dos extraterrestres dizimados por raios de pistola laser nos desenhos do Pernalonga – fizeram com que pensasse em se vingar da raça humana (por tê-lo incentivado a viajar) jogando-lhe nas costas, ou onde grudar, o peso de ele agora ser um oitavo de um homem.

Passou por entre lavradores a trabalhar nos campos de trigo. Incrivelmente conseguiu escapar, escamoteando-se das foices e enxadas que se puseram atrás dele. Decidiu então atacar criancinhas. Eram mais inofensivas. Em vez de se assustarem e fugirem em pânico, roubaram-lhe um pedaço para moldarem bichinhos. Confundi-lo com argila foi demais! Em torpor, dirigiu-se ao centro da cidade. Acabaria de vez com aquela história e tornar-se-ia um dezesseis avos de um herói. Seria perfeito!

Um casal de velhinhos foi a vítima. Sentados num banco da praça conversavam os dois sobre os avanços da tecnologia nos últimos anos. Um “BÚ” quase inaudível desviou suas atenções e calmamente perguntaram ao ex-tudo a que tipo de experiência ele fazia parte. Foi a gota d’água! Indignado com aquela reação “avançadinha”, começou a chorar, e contou de sua vida anterior à viagem, seus sonhos e ambições. Tudo destruído em uma questão de dias! O que seria daquele um trinta e dois avos de gente? Penalizados, os velhinhos resolveram levá-lo para casa e dar-lhe a atenção merecida, pelo menos até que ele se desintegrasse de vez. Não deu nem pra atravessar a rua. Quando desceu, ou melhor, despencou da calçada, juntou-se à água turva que descia pelo esgoto e sumiu por entre as grades. Ainda puderam ouvir, o casal de velhinhos e o fotógrafo – que finalmente chegara, mesmo atrasado – as últimas palavras do infeliz:

- Tchau, um beeeeij...